quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

POR UMA POLÍTICA DE REHABITAÇÃO DA CIDADE

A reabilitação urbana deve ser entendida como uma estratégia de combate ao cenário depressígeno que envolve a cidade e que resulta da migração da sua população nas últimas décadas – só nos últimos sete anos Lisboa perdeu mais de 50.000 habitantes.

Do ponto de vista urbano, Lisboa perde a sua dinâmica vivencial. Urge estancar a degradação, desertificação e a bi-polarização socio-territorial já diagnosticadas. Para tal, é fundamental salvaguardar o património edificado, disponibilizar no mercado fogos vagos a custos controlados e criar uma verdadeira bolsa de arrendamento, medidas essenciais para o combate à especulação pura e à segregação social, com vista à necessidade premente de estabilizar uma população diversa na sua composição etária e social, verdadeiramente inter-classista.

Em 2005, o programa Lisboa é Gente definia a estabilização e o reforço dos bairros tradicionais como medida indispensável para transformar a cidade em verdadeira atracção habitacional. Iniciar uma operação de obras urgentes nos fogos municipais devolutos, com especial destaque para Alfama, Madragoa e Mouraria, surge como uma medida fundamental numa política de reabilitação urbana virada para as pessoas e colocando as pessoas como prioridade absoluta na gestão integrada da cidade.

O Plano de Actividades apresentado prevê € 47.864.849 para a reabilitação urbana, valor que representa um aumento de 112% relativamente ao orçamento para 2008. O que aparentemente surge como uma grande prioridade de investimento do executivo, dilacerantemente é desmistificado, já que grande fatia é destinada à construção de duas ligações pedonais na Baixa-Chiado e à requalificação do Capitólio do Parque Mayer.

Ao contrário do desejável, o maior investimento não se reverte na reabilitação dos bairros residenciais, na recuperação do seu edificado com vista à criação de habitação. Com efeito, antagonicamente à premência sentida pelas populações, verifica-se um decréscimo orçamental gritante, que, no caso da Madragoa, chega a ser de 81%, comparativamente ao Orçamento do ano passado.

António Costa tenciona investir 11.745.271 euros na reabilitação urbana da Baixa-Chiado. Ora, esta verba revela-se um evidente equívoco, na medida em que não aposta na regeneração dos seus imóveis, e consequente promoção de uma política de habitação. Na realidade, 76,5% desse valor destina-se, em exclusivo, para a construção de ligações pedonais, nomeadamente o passadiço do Pátio B (traseiras da Rua do Carmo) ao Quartel do Carmo e o percurso pedonal assistido ao Castelo, ligações estritamente financiadas pelo Casino de Lisboa. Para a reconstrução e remodelação de edifícios estão apenas previstos 1.308 euros, ao passo que o arranjo de espaços exteriores mereceu a quantia de 322.411 euros.

Pese embora a discriminação em duas rubricas distintas, observa-se que apenas 20,8% da totalidade dos dinheiros camarários estão destinados à requalificação patrimonial, dos quais 19,3% são para projectos de reabilitação urbana e 1,5% têm como fim a construção, beneficiação e reconstrução de imóveis.

Em termos concretos, a CML promoverá a reabilitação de 42 edifícios nos bairros históricos e de sete edifícios devolutos municipais, gritante carência a que acresce um quase alheamento relativamente aos designados bairros sociais, não esquecendo o abandono a que as residências camarárias, sob a gestão da GEBALIS, estão votadas.

Sob este prisma, o Plano de Actividades, que acompanha o Orçamento para 2009, surge como um documento claramente demagógico e eleitoralista, virado para as obras de fachada, não promovendo as alterações profundas que a cidade necessita. Ao não promover a atractividade residencial do concelho, a edilidade não só impede a inversão do decréscimo populacional flagrante, como ainda rejeita o reforço significativo nas receitas estruturais do Município que o aumento de habitantes sempre implica.

A permanência numa política que privilegia as grandes operações imobiliárias e seus beneficiários, e a insistência em práticas de desfavorecimento dos cidadãos e das cidadãs com menores recursos económico-financeiros conduz, inevitavelmente, à rarefacção da cidade, com especial incidência no seu centro, processo que poderá culminar na regressão da população lisboeta para um nível inferior a 500.000 habitantes. Vazia, Lisboa definha.

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