quinta-feira, 17 de julho de 2008

AS OUTRAS QUINTAS DA FONTE


É reconhecido que o Programa Especial de Realojamento (PER), lançado em 1993 mediante um acordo entre o governo de então e as autarquias, teve papel decisivo na diminuição drástica dos bairros de barracas nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Porém, a operação PER, devido à sua própria concepção, acabou por determinar o padrão maioritariamente concentrado e suburbano da generalidade dos bairros de realojamento que temos hoje nas áreas metropolitanas.

À segregação territorial sobrepuseram-se, frequentemente, a étnica e a social. Geraram-se, deste modo, os sítios da pobreza, do desemprego, do insucesso escolar, das culturas marginais e da reprodução de todos os mecanismos da exclusão, de forma massificada, de perfil muito idêntico ao do agora mais conhecido Bairro da Quinta da Fonte.

É preciso reconhecer que o PER foi mal conduzido e não acautelou todas as consequências previsíveis, conforme experiências que entretanto já tinham sido estudadas noutros países europeus. Os recentes acontecimentos no Bairro da Quinta da Fonte são a expressão disso mesmo. Não podem ser reduzidos a um mero problema de ordem pública ou ficarem-se pela gravidade do desacato violento entre vizinhos de origem étnica diferente. Conflitos entre vizinhos sempre existiram e continuarão a existir. Mas este caso não pode ser dissociado da crise social que se vive em muitos bairros de realojamento. É lamentável que a resposta do governo se tenha resumido praticamente à promessa de um “contrato local de segurança”, ou seja, mais polícia e mais lógica securitária.

É exigível aos poderes públicos, governo e autarquias, que garantam a segurança a que os cidadãos têm inquestionável direito. Mas também lhes é igualmente exigível que enfrentem os erros com seriedade e profundidade. Torna-se urgente promover um programa que supere os processos de realojamentos tal como foram acontecendo e assuma com frontalidade a necessidade absoluta de olhar para as periferias. Depois de todo o “show off” em torno dos Polis para alguns centros das cidades, é preciso um “Polis social” que reabilite, em termos físicos, sociais e económicos, os bairros e as áreas suburbanas que caíram numa espécie de espiral depressiva. Caso contrário, de certo que a Quinta da Fonte não ficará confinada à freguesia da Apelação.

Pedro Soares escreve no JN, semanalmente, à quinta-feira.
psoares@be.parlamento.pt

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