TRADIÇÕES...
Apesar das festas dos Santos Populares serem sempre o que a tradição manda, sentia-se que alguma coisa de diferente pairava no ar. O presidente da Câmara do Porto tinha vindo a Lisboa assistir às marchas do Santo António, a convite do congénere alfacinha. Quinze dias depois, António Costa “subia” ao Porto para retribuir e, pela primeira vez, participar nas festas joaninas.
Se isto era o ressurgimento do Bloco Central, Rio respondeu com um sorriso: “Só se for ao nível dos Santos Populares”. Soube-se agora que, afinal, São João e Santo António tinham juntado Costa e Rio para negociarem a possibilidade de fazer chegar ao Parlamento, de novo, a proposta de lei eleitoral autárquica que se tinha perdido no meio da turbulência interna do PSD.
De facto, parece que há um fado na política portuguesa que impele PS e PSD para convergências que tornam a democracia menos democrática e a vida das pessoas mais difícil. Neste caso da lei autárquica, trata-se de diminuir a proporcionalidade da representação eleitoral nos Executivos municipais, forçar maiorias absolutíssimas mesmo quando não correspondem à verdade do voto e reduzir as oposições a uma expressão mínima, praticamente inoperante. Trata-se de transformar presidentes de Câmara numa espécie de caciques locais e de impor a quietude dos pântanos na política autárquica.
O sistema autárquico já demonstrou não ter um problema de governabilidade em geral. Tem, isso sim, um grave problema de capacidade de fiscalização democrática sobre as maiorias que se formam nos executivos municipais. Porém, PS e PSD, à parte conflitualidades internas, querem poderes absolutos nas Câmaras, mas não reforçam os poderes fiscalizadores e de iniciativa das Assembleias Municipais. Pretendem retirar o direito dos presidentes de Junta de Freguesia votarem os orçamentos municipais, dos quais dependem em grande medida, contudo não tomam uma única medida para conferir autonomia financeira efectiva às freguesias.
PS e PSD dispostos a unirem-se pelo poder absoluto? Seria absolutamente lamentável e um grave entorse na transparência democrática. Mudar as regras do jogo em pleno ciclo eleitoral que se inicia já no próximo Domingo, com as eleições regionais dos Açores, só poderia demonstrar uma desmedida ansiedade pelo “quero, posso e mando”. E todos sabemos quais seriam as consequências. Que nos valham Santo António e São João e, já agora, São Pedro também.
Pedro Soares escreve no JN, à 5ª feira.
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